17 maio, 2010

E nós que somos a doença e o pecado'

Psicólogo Pedrosa responde: Já fiz de tudo para reverter a minha homossexualidade. O que faço?
  • Por João Pedrosa* 13/5/2010 - 18:52

Olá, Dr. João! No meio de tantas buscas na internet, achei um artigo que o senhor escreveu falando sobre a homossexualidade. Me assumi homossexual há seis meses, mas sofro com o meu próprio inconsciente, uso a psicoterapia há mais de 10 anos, hoje estou com 18. Aos oito anos, um psicanalista "descobriu" a minha homossexualidade, tentou revertê-la com psicoterapia e me impôs a obrigação de gostar de meninas, mesmo sem sentir nada por elas. Aos meus 15 anos, entrei em um estado depressivo considerado muito grave, remédios de uso comum como fluoxetina e alprazolam não surtiam efeito algum sobre meu organismo. E eu continuava tentando mudar minha orientação sexual, pois é um pecado muito grande no meio cristão, onde somos encarados como leprosos e somos afastados de tudo e de todos.

Passei a sofrer de fobia social também, que depois veio a se transformar em um estado de paranoia parecido com esquizofrenia, de 30 em 30 minutos sofria com colapsos de pavor e somatizações, como: vômitos, falta de ar e taquicardia. Depois de meses com o mesmo psiquiatra, que só trocou a fluoxetina pela paroxetina, eu fui a um neurologista que me deu uma gama de remédios: Amitriptilina, Bupropiona, Sertralina e Rivotril. Não tive mais crises de pânico e a depressão se atenuou ao ponto de conseguir frequentar a um psicólogo que infelizmente era um dos adeptos da nova onda de "reversão sexual" a qual me impunha a pensar e ver filmes eróticos heterossexuais para que meu psiquismo se acostumasse com a cena e passasse a ter prazer com aquilo... Foi catastrófico, toda a minha depressão voltou e eu parei de trabalhar novamente...

Hoje sou dependente de remédios e vivo de psicoterapia, não sei mais o que fazer, não sei mais aonde procurar ajuda, não sei mais o que faço, se existe algo que reverta a minha sexualidade, me indique, não aguento mais tanto sofrimento. Já tentei sem sucesso o suicídio três vezes, me oriente, por favor! Obrigado! Silva (SãoPaulo - SP)

A ideia de mudar a orientação sexual de uma pessoa é totalmente ultrapassada. Antigamente alguns psicólogos acreditavam ser possível esta mudança. Tentaram mudar através da terapia de reversão, mas a literatura científica não registra nenhum caso de sucesso. O máximo que conseguiram foi fazer com que o gay deixasse de praticar o sexo homossexual, mas o desejo homossexual continuou. Sabe-se hoje que não é possível mudar este desejo. A pessoa morre com ele.

Desde a década de 1970, depois de estudos e pesquisas, entidades representativas e científicas de psicólogos nos Estados Unidos da América, na França, na Espanha, no Brasil, entre outras, concluíram que a orientação sexual homossexual não é uma doença, nem um distúrbio, nem uma perversão e, sim, uma variante normal da heterossexualidade. E para que indivíduo possa ser emocionalmente saudável e ter uma boa qualidade de vida é necessário que ele vivencie a sua verdadeira orientação sexual, ou seja, aquilo que ele realmente é. Portanto, como a homossexualidade não é uma doença, nada precisa ser tratado. O trabalho do psicólogo deve ser focado no apoio e no acolhimento da pessoa homossexual no sentido de que ela possa vivenciar sua homossexualidade superando possíveis barreiras, preconceitos e discriminações.

Lamentavelmente, existe um grupo de psicólogos ligados a religiões, católica e evangélica em particular, que confundem religião com psicologia. Utilizam-se dos dogmas da religião para desenvolver seu trabalho profissional propondo a "cura" da homossexualidade. Do ponto de vista científico isto é uma grande fraude, pois a psicologia não reconhece que seja possível reverter a orientação sexual e o Conselho Federal de Psicologia do Brasil, através da Resolução 001/99, proíbe o psicólogo de utilizar esta prática junto aos seus clientes.

O resulta do trabalho destes psicólogos, que prometem a reversão, são danosos. Os efeitos colaterais são severos distúrbios comportamentais e psiquiátricos. Foi o que aconteceu com você. Infelizmente, você é mais uma vítima da violência cometida por estes psicólogos. Ao tentar "curar" algo que não tem cura provocam graves sequelas emocionais nos seus clientes homossexuais.

Acho que o caminho não é o suicídio. Você tem que ter coragem e enfrentar a vida. Criar um repertório de enfrentamento contra a homofobia e saber como lidar com sua homossexualidade é o melhor caminho para você. Para isto é necessário que você procure um profissional da psicologia que referencie sua prática tendo como base os pressupostos científicos e não a religião. Este profissional poderá ajudá-lo. Ser gay é muito bom e saudável. Seja forte e corajoso, não desista de viver. Receba meu abraço fraterno!

*João Batista Pedrosa é psicólogo (CRP 06/31768-3) e autor do livro "Segundo Desejo" (Iglu). Envie suas dúvidas e perguntas para pedrosa@syntony.com.br. Seu site: http://www.syntony.com.br/

Retirado do site A CAPA: http://acapa.virgula.uol.com.br/site/

Um comentário:

  1. "Receba meu abraço fraterno!"
    É o que muitos homossexuais precisam ouvir, palavras de aceitação, necessitam ter a sensação de proteção. Além de lidar com família, amigos, desconhecidos (pessoas que não aceitam sua homossexualidade), às vezes somos nossos próprios algozes, àqueles que nos empurram no armário escuro e tenebroso.

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